COMO É O PROCESSO DE PRODUÇÃO
DAS MINHAS PALESTRAS

(Publicado em 28/08/2019)



Não. Não vou apresentar aqui o passo a passo para você criar e apresentar uma palestra. Acho que cada um encontra o seu próprio caminho e ajusta seus próprios processos.

Mas vou contar aqui, com detalhes, como é que EU faço para produzir e apresentar as MINHAS palestras, desde a ideia inicial até o "muito obrigado" no final da apresentação:





Imagem: OitoNoveTrês



No meu caso, existem dois tipos de processos: as palestra que já existem como tópicos de cursos ou aulas e as palestras novas

O TIPO 1
Acontece, algumas vezes, de um determinado tópico de uma aula ou curso ser muito interessante e ter um começo, meio e fim num tempo de aproximadamente uma hora, ou seja, pode ser apresentado independentemente do contexto do curso ou da aula em si. Nesse caso é necessário apenas separar aquele material como uma palestra para ser apresentado como conteúdo independente.

É o tipo de palestra fácil de produzir, pois todo o processo de construção do conteúdo e outras preparações já está pronto (já foi feito), inclusive os eventuais problemas de apresentação já foram corrigidos nas inúmeras vezes que aquele tópico já foi apresentado em cursos ou aulas.

O TIPO 2
O segundo tipo de palestra (o mais difícil) é aquele que surge de uma ideia minha ou da sugestão de algum amigo ou de alguém da OitoNoveTrês sobre um tema que pode ser explorado e que resultaria em uma palestra interessante. Esse tipo de palestra tem um processo produtivo bem diferente, que eu vou contar agora:

A DEFINIÇÃO DO CONTEÚDO
Esse processo é dividido em 5 etapas: a primeira etapa é a definição do conteúdo. Eu penso a respeito daquele tema e me pergunto "o que EU, como espectador, gostaria de saber? Que informações eu gostaria de receber numa palestra sobre o assunto? Que perguntas eu gostaria de ver respondidas numa palestra como essa?"

Aí eu elaboro uma lista de perguntas que vão me orientar durante o processo de busca de informações sobre o tema. E (isso é importante), para cada uma dessas perguntas, é preciso ter uma resposta com certo grau de profundidade. Não pode ser uma resposta rasa, que não resista a uma réplica. Essa primeira etapa define o que eu preciso estudar antes de apresentar a palestra. Nessa etapa eu defino quais livros eu preciso ler e verifico se estão disponíveis na minha biblioteca ou se preciso adquirir ou pedir emprestado de algum amigo. É muito raro uma palestra estar sustentada em apenas um único livro.

A PESQUISA NA LITERATURA
Na segunda etapa, pesquisa na literatura, podem surgir alguns insights e outros tópicos podem ser incluídos no conteúdo da palestra. Esses tópicos são então divididos em 4 grupos (atenção para esse detalhe): todo o conhecimento que será apresentado na palestra é dividido em 4 grupos pois isso facilita o entendimento geral, a memorização e o controle do tempo da palestra.

Acontece, às vezes, nesse processo de pesquisa, de eu entender que preciso conversar com pessoas que são especialistas naquele assunto ou que, de alguma forma podem me ajudar de forma importante. Felizmente eu tenho muitos amigos que são bons em muita coisa e quase sempre consigo me valer deles. Envio e-mail, faço contato pelo whatsapp ou mesmo faço uma visita para uma boa conversa. Esse tipo de “socorro” muitas vezes é fundamental para a qualidade da apresentação.

À medida que eu vou desenvolvendo algumas convicções intermediárias do conteúdo, eu começo a escrever pequenos ensaios, textos curtos de 5 ou 6 mil caracteres. Tipicamente, um artigo desses que eu publico no meu site. Esses artigos poderão ser, mais tarde, incorporados ao texto/roteiro da palestra.

O ROTEIRO DA PALESTRA
Essa segunda etapa (pesquisa na literatura) demora algum tempo, dependendo da complexidade do tema. Geralmente, de 3 a 5 semanas. Termina quando eu me sinto em condições de partir para a terceira fase do processo: elaborar o roteiro para a palestra.

O roteiro é dividido em duas partes: o sumário e o texto propriamente dito. No sumário eu simplesmente divido o conteúdo em tópicos e subtópicos. O texto, evidentemente, é o desenvolvimento desse sumário.

É muito importante definir como será a abertura da palestra, que define a abordagem que darei ao tema. Da mesma forma, o tópico de encerramento é importante, pois define as conclusões que eu pretendo que os espectadores da palestra tenham.

Nessa etapa eu estou produzindo não apenas o texto da palestra mas também, simultaneamente, os slides da apresentação, uma vez que já está muito clara a sequência em que as informações serão colocadas na palestra. Geralmente, tanto para o texto quanto para os slides eu copio a estrutura de uma palestra já existente. Assim não tenho de perder tempo fazendo a formatação dos arquivos.

Minha autoapresentação faz parte da palestra, embora eu não tenha o hábito de contar a história da minha vida na abertura de cada palestra. Muitos palestrantes hoje em dia fazem isso. Eu não acho legal (à menos que a palestra seja biográfica, ou seja, sobre a vida do palestrante). Em alguns casos até pode funcionar, mas é muito raro que a história da vida do palestrante seja realmente mais importante do que o conteúdo que ele se propõe a mostrar. Minha autoapresentação geralmente dura 2 ou três minutos, no máximo.

Evidentemente, a produção do texto da palestra leva em conta o meu principal recurso didático, que é a abordagem conceitual com o uso de metáforas, símbolos e infográficos. Geralmente não utilizo o recurso de contar histórias (storytelling), embora reconheça que é um recurso interessante, quando bem aplicado (o que é raro). O que eu faço é apelar para (e contar com) a inteligência e o raciocínio abstrato da plateia.

Às vezes eu escrevo um texto e crio um slide que apresente aquele conteúdo. E, algumas vezes, eu tenho a ideia de um slide que lida com aquele conteúdo e, a partir do slide eu escrevo o texto. Não existe uma fórmula perfeita e rápida para essa construção.

Quanto aos slides, alguns palestrantes utilizam apenas imagens (ou conjuntos de imagens). Outros utilizam apenas palavras chaves ou frases curtas. Eu não acho que isto seja errado. Mas a construção dos slides das minhas palestras geralmente é feita com infográficos, conceitos ou definições. Na minha concepção, os slides não devem servir apenas para ajudar e orientar a mim (como palestrante) mas também ao espectador. Devem servir para levar conteúdo aos espectadores.

Esse processo de escrever o texto da palestra e os slides leva muito pouco tempo. Geralmente uma semana a 10 dias, trabalhando duas ou três horas por dia nessa tarefa. É bom lembrar que uma boa parte do texto já foi produzida naqueles artigos escritos na fase de pesquisa.

LAPIDAÇÃO
Concluído esse processo, se houver tempo, eu passo pelo menos uma semana sem lidar com essa palestra, sem trabalhar no material (cuidando de outros assuntos). É como se estivesse deixando a massa do pão crescer naturalmente, sossegada.

A quarta fase: a primeira coisa que eu faço ao retomar esse trabalho é LER O TEXTO com o arquivo dos slides aberto. E vou corrigindo qualquer coisa, à medida que apareça. Esse processo (de ler o texto inteiro e alterar alguma coisa, se necessário) eu repito três ou quatro vezes.

Nesse momento eu volto às perguntas que eu anotei lá na primeira fase (definição de conteúdo). Verifico se todas as questões foram abordadas e esclarecidas.

A palestra está pronta! Já poderia ser apresentada, se o tempo é curto ou tem um evento naquela semana. Mas, claro, a palestra ainda está crua. Se eu tiver algum tempo, faço algumas coisas: primeiro, a leitura do texto em voz alta, no ritmo e tom de voz da apresentação, para testar o tempo;

Segundo, se eu tiver oportunidade, fazer uma apresentação piloto para uma, duas ou três pessoas dispostas a ouvir a apresentação. Aí já não mais lendo e sim falando normalmente, com o apoio apenas dos slides no monitor.

A APRESENTAÇÃO DA PALESTRA
Finalmente, a apresentação da palestra para o público. Isso é uma das coisas que mais me dá prazer. Talvez por isso eu me empenhe tanto em produzir a palestra com muito cuidado. Gosto tanto e tenho tanto prazer em me apresentar para uma plateia que não gosto de correr o risco de que algum despreparo atrapalhe esse momento. Geralmente me sinto muito seguro quando pego o microfone para começar uma palestra.

Um detalhe (quem me conhece já sabe disso): eu nunca fico nervoso nem apreensivo diante de uma plateia, seja de 5 ou de 500 pessoas. Me sinto em casa. No entanto, eu fico muito, muito pilhado. Muito concentrado. Algumas vezes no dia seguinte, me dou conta de que não consigo lembrar do que aconteceu nos minutos imediatamente anteriores à palestra começar (isso já acontecia quando eu era atleta. Eu me esquecia completamente dos minutos que antecediam a largada. Essas memórias voltavam somente algumas semanas depois).

Durante a apresentação de uma palestra eu estou atento a várias coisas ao mesmo tempo: presto atenção nas minhas palavras, nos meus gestos, na sequência do conteúdo que está sendo apresentado, no relógio que marca o tempo (na tela do monitor de retorno), nos olhos dos espectadores, nos seus movimentos e nas reações a cada novo conceito apresentado. Esse processo iterativo automático vai ajustando o tom e o ritmo da palestra. É um exercício muito estimulante. Depois de mais de 30 anos apresentando palestras (e eu tive de ler alguns livros sobre o assunto) acho que eu aprendi a ler a plateia, pelo menos o suficiente para evitar incidentes e percalços.

Ainda assim, se eu apresento uma palestra entre 20 e 22 horas, por exemplo, dificilmente vou conseguir dormir antes de 1 hora da manhã. Leva algum tempo pra desligar. E não importa se eu já apresentei aquela mesma palestra 5 ou 50 vezes e nem se o evento é menos ou mais importante. É sempre a mesma coisa.

Essa sensação de euforia e alegria é o que me motiva. Gosto muito disso. E espero produzir e apresentar palestras ainda por muitos anos.





PADILHA, Ênio. 2019





Comentário #1 — 28/08/2019 14:10

Ligia Fascioni — Engenheira Eletricista — Berlim, Alemanha

Nossa, que super-aula! Meu modelo é parecido (se bem que não sou tão disciplinada assim) e sou da turma do Steve Jobs: quase zero texto e muita imagem e storytelling. Mas a produção do conteúdo é bem semelhante.
Perfeita orientação para quem está se preparando para as primeiras apresentações ou quer melhorá-las.

RÉPLICA DE ÊNIO PADILHA

Realmente, Lígia, não existe uma fórmula. Cada palestrante encontra o seu caminho e desenvolve o seu método. Apenas uma regra é DE OURO: esteja muito bem preparado. isso dá a segurança e conforto que permite desfrutar o momento em que você é o centro das atenções e pode dar o seu recado. Fazer uma palestra quando se está bem preparado é como marcar um gol (jogando em casa e com o estádio lotado).

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