
MARKETING BASEADO EM MENTIRAS E ENGANAÇÕES
(Publicado em 22/08/2014)
Fiquei muito feliz! (só que não.)
Acabei de receber um e-mail (e não é spam. Tem nome endereço e contatos do remetente) de uma empresa que representa o TROFÉU DESTAQUE ARQUITETURA.
O e-mail diz o seguinte:
Bom dia, sou do Troféu Destaque Empresarial e temos o prazer de convidar sua empresa para receber o Troféu Destaque Empresarial 2014 no segmento de ARQUITETURA.
Objetivo: O Troféu Destaque Empresarial é realizado há 15 anos e tem como objetivo reconhecer e identificar empresas que se destacam no mercado pela qualidade e excelência dos seus produtos e serviços oferecidos, diferenciando e valorizando as empresas e profissionais que contribuem efetivamente para melhoria continua na qualidade dos seus produtos e serviços em seu respectivo segmento de atuação.
Benefícios: Além do reconhecimento público sua empresa recebe o certificado com moldura em acrílico personalizado com o nome da empresa, selo de qualidade, pasta com acesso aos dados relativos a pesquisa e critérios de avaliação utilizados e o selo de qualidade do Troféu Destaque Empresarial que pode ser utilizado em todas as mídias e canais de comunicação utilizados pela empresa.
Para receber o material basta confirmar por e-mail a entrega, é pago apenas o custo de envio após a entrega do material apenas R$199,00 (APÓS A ENTREGA). Não há nenhum custo adicional. Aguardamos confirmação.
Atenciosamente
Fulana de Tal
Troféu Destaque Empresarial
Aí me lembrei que, em 1995, quando eu ainda tinha um Escritório de Engenharia Eletrica eu também fui abordado por uma empresa dessas. E escrevi um artigo para uma coluna que eu tinha num jornal local, nos seguintes termos:
Alguns empresários investem na qualidade dos seus produtos, no gerenciamento dos custos, no desenvolvimento dos recursos humanos... Outros simplesmente investem na ingenuidade dos seus clientes:
Quando a esmola é demais o santo desconfia.
Fui procurado por um "executivo" de uma empresa de "Pesquisa de Opinião Pública" que veio me cumprimentar e dar a notícia de que a minha empresa havia sido escolhida como a melhor do setor, na nossa cidade. O "prêmio" seria entregue em uma concorrida "solenidade" (jantar, discursos, homenagens) a ser realizada algumas semanas depois em um clube local. É claro que, para isto eu (assim como todos os demais "eleitos") teria de contribuir com uma simbólica quantia (algo equivalente a uns duzentos dólares) a título de patrocínio para a solenidade de premiação.
Para surpresa dele, não dei pulos de alegria nem me senti lisonjeado pela conquista. Pelo contrário, desconfiei de que havia, no mínimo, um engano.
Perguntei então como fora feita a pesquisa que levou a esse resultado. Ele me explicou, em tom professoral, que foram distribuídos 120 questionários entre proprietários e gerentes do comércio local. Esses questionários foram depois recolhidos e as respostas tabuladas. Daí o resultado final.
Para nova surpresa dele, minha desconfiança aumentou ainda mais. Expliquei a ele que as chances de o nome da minha empresa ser lembrado em uma pesquisa feita no comércio eram remotíssimas, por dois motivos simples:
1. Praticamente toda a nossa atividade operacional e as nossas políticas de marketing estavam voltadas para clientes industriais e grandes construtoras. Não havia, definitivamente, uma boa chance de que fôssemos conhecidos e reconhecidos por pessoas que atuam no comércio.
2. Ainda que a "pesquisa" tivesse sido feita na área industrial, eu lamentava dizer, mas nós sabíamos muito bem que não éramos líderes do mercado. Ainda estávamos longe disso. Por maiores que fossem os nossos esforços, reconhecíamos que alguns concorrentes ainda estavam à frente na preferência do mercado. É claro que estávamos trabalhando para mudar este quadro, mas sabíamos que um diploma na parede não iria resolver o problema.
Além disso tudo, uma empresa de pesquisa de opinião deveria saber que a distribuição de 120 questionários no comércio local não vai levar ninguém, jamais, a um resultado com um mínimo de confiabilidade. Em qualquer curso básico sobre pesquisa eles teriam aprendido que a amostra tem de refletir o universo, ou seja, os questionários teriam de ser respondidos, de forma proporcional, por comerciantes, industriais, profissionais liberais, donas-de-casa, estudantes, operários...
Resumindo, aquilo era um Prêmio de Araque. Um golpe em que alguns empresários caem, muitas vezes sem se dar conta. Trata-se de uma operação de estelionato cujo combustível é formado pela má-fé e ganância de uns e pela vaidade e ignorância de outros, com a conivência e o aplauso da platéia.
Esses prêmios e diplomas continuam a serem "conquistados" todos os anos por muitas empresas.
Meus parabéns aos "premiados". Façam a festa, paguem o dinheiro que o "Instituto de Pesquisa" está cobrando pelo prêmio. Pendurem o diploma na parede... Mas, por favor, não esqueçam que é tudo de mentirinha.
Só me resta dizer o seguinte à moça que me mandou o e-mail: quase vinte anos depois... eu ainda não mudei de ideia sobre este assunto. Passar bem.

PADILHA, Ênio. 2014

|